Alto-falantes: ‘Devaneio’, ‘Tango dentro da noite’ e as peripécias de Oswaldo Paciulli!

“Quero dedicar a música Lencinho Querido, da Dalva de Oliveira, para a moça de vestido cor de rosa, que está encostada na cerca da Paulista e pedir licença para me apresentar, pois a achei muito charmosa”.

Os jovens, principalmente os solteiros, tinham programa certo nos finais de tarde de domingo nos anos de 1950: o ponto de encontro era na frente da estação de trem, onde amigos se reuniam e rolava a paquera.

Este local logo passou a contar com um sistema de alto-falantes instalado no terraço do edifício Kaiála, bem em frente da estação, e foi assim que, após subir os três lances de escadas, Antônio Carlos pagou a Oswaldo Paciulli para que seu pedido fosse anunciado lá do alto.

Este programa na verdade era um aquecimento e durava até as 18h40, quando chegava o trem com as últimas notícias do dia e todos seguiam em verdadeira procissão em direção ao “Jardim da Praça” para novos encontros.

Ao cair da noite, com a fonte e suas luzes acessas, a Praça Comendador Müller recebia também aqueles que saíam do Cine Cacique para ser o palco do engenhoso sistema de circulação destinado exclusivamente ao flerte e a paquera, conhecido como footing.

Nas noites de sábado, a mesma praça contava com a transmissão do programa “Tango dentro da noite”, que era realizado no estúdio improvisado por Paciulli no terreno de sua família, na Rua Washington Luiz, esquina com a Fernando Camargo (hoje edifício Abdo Najar).

Em um tempo em que “choravam as casadas e cantavam as solteiras”, Americana comungava com o restante do país grande paixão por músicas latinas, como francesas e italianas, mas com maior ardor aos tangos e boleros, que em versões ao português, “no dia em que me queiras” muitos peitos fizeram suspirar.

Neste período, Americana não contava com uma rádio local, possuía poucos bairros, todos muito próximo do Centro. O sistema de alto-falantes criado por Paciulli foi uma grande sacada comercial, mas também foi uma forma de socialização e passa tempo de um jovem.

Para além de propiciar namoros e talvez enlaces duradouros e felizes, foi neste estúdio em frente à praça que nasceu outro programa, este apresentado nas manhãs de domingo, chamado “Devaneio”, que intercalava música, história, filosofia, literatura e poesia.

Este programa reuniu um grupo de jovens inspirados: Hélio Feola, Antônio Zoppi, Geraldo Miante, Theodolindo Pedro Mastrodi, Walter José Faé e Oswaldo Paciulli, que entre uma música e outra, liam ou declamavam suas produções literárias, assim como esta do Zoppi: “Eu não sou vagabundo, nem guerreiro sem brasões. Preciso enfeitar o mundo com sorrisos e canções”.

Este sistema de comunicação fez tanto sucesso que Paciulli teve a ideia e conseguiu autorização para ligar o estúdio da praça com o estúdio do edifício Kaiála, tornando as transmissões dos programas simultâneas.

“Quanto tempo o tempo tem? Eu não sei, não lembro muito bem, mas aquele sentimento eu não esqueço…” E por isso dedico ao garboso cavalheiro, o mais alegre e gentil que tive a honra e o prazer de conhecer, Oswaldo Paciulli, esta modesta crônica pelos seus felizes 94 anos completados em 23 de junho último.

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