Discurso do vereador Antônio Zanaga na sessão da Câmara do dia 21 de junho de 1960, em homenagem a Dr. Antônio Alvares Lobo (grafia original).
“Sr. Presidente e srs. Vereadores
Comemorou-se no dia 15 último, o centenário do nascimento de Antônio Alvares Lobo, nascido na histórica cidade de Itu, aos 15 de junho de 1860, filho do maestro Elias Alvares Lobo e de dona Eufrosina da Costa Lobo.
Embora ituano de nascimento, radicou-se jovem ainda em Campinas, terra que adotou e na qual viveu toda sua magnifica existência, onde nasceram seus filhos e em cujo seio repousou no sono eterno. Em Campinas, como era de se esperar, diversas solenidades foram realizadas comemorando esse centenário do seu nascimento.
Gostosamente, embora com as minhas naturais falhas, do que peço me revelem os nobres colegas, procurarei dizer alguma coisa sobre essa figura empolgante de cidadão e homem público que foi o Dr. Antônio Lobo, ao qual só tive a felicidade de me aproximar nos últimos anos se sua vida.
Foi Antônio Lobo uma bela figura de homem, simpático, sempre muito elegante no trajar, de trato muito agradável e acessível; culto, bom orador, tribuno notável; grande advogado, estudioso e dedicado, teve uma vida intensamente vivida, inteiramente devotada ao bem comum. Naqueles tempos, os homens públicos não se enriqueciam com a política, ao contrário. E Antônio Lobo, quando deixou a política, lá por 1928 como muitos outros chefes políticos daqueles tempos, tão caluniados, tinha grande parte do seu patrimônio reduzido.
Quando nossa terra era ainda um vilarejo com apenas alguma dezena de casas modestas em frente a estação da estrada de ferro, no caminho da Carioba e no caminho de Santa Barbara, aqui desembarcava, quase todas as semanas, o Dr. Antônio Lobo em demanda da sua Fazenda Santa Guilhermina (a atual Fazenda Moinho Azul) situada em frente à Carioba, do outro lado do Rio Piracicaba, no município de Limeira.
Fazia esse percurso por ser mais comodo, pois que, desembarcando na estação ferroviária local, daqui passava por Carioba e atravessando o Rio Piracicaba de canoa ou balsa, estava já nas terras da sua propriedade agrícola. Com suas continuas viagens, travou conhecimento com os moradores do lugar e comunicativo e bondoso como ele era, criou logo amizades, ligando-se principalmente com Sebastião Antas de Abreu, que naqueles tempos possuía um modesto armazém de secos, molhados, ferragens e outros materiais e onde fazia seu ponto.
Ali se realizaram quase todas as reuniões políticas de largo período da vida de Vila Americana e alí procediam-se os encontros e discutiam-se os problemas, ouviam-se as queixas e as reclamações dos habitantes da região.
A ação de Antônio Lobo, que ocupava já então cargos de marcada evidência na cidade de Campinas, fez-se sentir sempre presente, sempre atuante, sempre solícita em todos os momentos da vida da localidade ainda no seu nascedouro.
Convem recordar que a estação da estrada de ferro Paulista denominava-se então de estação de Santa Barbara, muito embora, por portaria do Cônego Manoel Vicente, governador do Bispado de São Paulo, houvesse sido criada a Paróquia de Santo Antônio de Vila Americana em data de 28 de junho de 1900.
Esse foi o primeiro passo da vida da localidade e ao qual seguramente não esteve estranho o dr. Lobo. Os habitantes da região tinham, como é natural, suas reivindicações e entre elas predominava a das dificuldades de comunicação com a sede do município, Santa Barbara e com a sede da comarca que era Piracicaba.
A estrada Municipal, de conservação precária, nem sempre dava passagem, e isso dificultava seriamente a vida daquela gente. Com a cidade de Campinas havia a ligação por meio da estrada de ferro, fácil e barato meio de comunicação.
Iniciou-se então um trabalho lento, persistente, demorado, cheio de óbices e dificuldades, visando desmembrar Vila Americana do Município de Santa Barbara e da comarca de Piracicaba, para passar a pertencer ao município de Campinas. A luta foi dura e foi longa. Se em Campinas, podiam nossos primeiros habitantes contar com o trabalho decidido de Antônio Lobo e este com o apoio de Francisco Glycerio e de Bento Quirino, dentro das hostes partidárias do PRP., por sua vez contavam Santa Barbara e Piracicaba com a ação decidida dos Morais Barros e de Campos Sales e com a capacidade jurídica de Francisco Morato, já então um jurista de nomeada.
O processo de descriminação de divisas iniciado naquele tempo, foi objeto de acirrados debates partidários e também na Câmara dos Deputados e no Senado Estadual. Nesse intervalo é substituído o nome da estação ferroviária, suprimindo-se o de Santa Barbara e colocando-se o de Vila Americana e a 30 de julho de 1904 pela lei nº 916 foi criado o distrito de paz de Vila Americana, cujo território se compunha de terras do município de Campinas sendo o novo distrito incorporado a este município, separando-se assim do município de Santa Barbara e da comarca de Piracicaba.
Essa vitória, foi na ocasião comemorada com grandes festas pois que houvera muitas perseguições e os poucos e modestos negociantes que se achavam estabelecidos na vilazinha haviam sido multados, autuados e tinham tido seus bens penhorados por executivos municipais.
Pouco tempo depois da criação do distrito de paz, com o tento de bem servir a vila, indicou para o cargo de sub-prefeito o seu amigo e prestante cidadão Sebastião Antas de Abreu. Aconteceu, porém, que o então Prefeito Municipal de Campinas, intendente municipal como era denominado, na ocasião o Dr. Heitor Teixeira Penteado, que posteriormente prestou também grandes serviços à nossa terra, certamente por interesses partidários nomeou outro cidadão.
Houve o inevitável choque entre os dois ilustres homens públicos campineiros que permaneceram separados até sua morte, embora dentro do mesmo partido político e com o respeito mútuo de homens de bem, cultos e honrados.
Posteriormente esta separação tornou-se mais acentuada, quando Antônio Lobo patrocinou a criação de nosso município e bateu-se por alcançar esse objetivo dentro do seu partido e na Câmara dos Deputados, bem como junto aos seus amigos do Senado. Não fosse a medida pleiteado, a criação do novo município, uma questão de justiça plena; não fosse nosso patrono um homem de bem, um cidadão exempla, um político de vida reta, inatacável e também de grande coragem cívica, como era Antônio Lobo e possivelmente essa sua atitude poderia traduzir o fim da sua vida política.
Mas Antônio Lobo, que já combatera destemerosamente a grande quantidade de escravocratas de Campinas, um dos maiores centros agrícolas do período escravagista do País e que enfrentara a ameaça de ser expulso da cidade com apenas 24 horas de prazo, sabia que estava também desta vez com a boa causa, com a causa da justiça. E graça aos seus trabalhos, e graça aos seus esforços, concretizava-se pela lei nº 1983 de 12 de novembro de 1924 a criação do Município de Vila Americana, que se instalava no dia 12 (SIC) de janeiro de 1925 com grandes festividades que se transformaram em magnifica apoteose ao nosso querido patrono.
Esse belo retrato do ilustre homenageado que ornamenta nossa sala de trabalhos, foi inaugurado em 12 de novembro de 1926, no segundo aniversário do município, tendo sido orador na oportunidade o dr. Liráucio Gomes, então presidente da Câmara, que pronunciou bela oração.
Antônio Alvares Lobo que foi vereador, intendente municipal e presidente da Câmara Municipal de Campinas, que foi deputado estadual em diversas legislaturas e presidente da Assembleia Legislativa do Estado por muitas legislaturas, sempre digno, respeitado e bem quisto por todos e que segundo o testemunho vivo de Altino Arantes “foi sempre incansável, consciencioso e eficiente cumpridor dos deveres dos seus mandatos, aos quais soube emprestar, sem pausas e sem desfalecimentos, o brilho de seu talento, a eloquência de sua palavra, o prestígio de sua honradez e do seu patriotismo”.
Além de advogado e político foi Antônio Lobo um abnegado e um grande espírito de caridade, tendo sido provedor durante 15 anos da Santa Casa de Campinas e um grande vicentino, que distribuiu benesses a mãos cheias, dentro de sua formação religiosa de amor ao próximo.
Foi por seu intermédio, mesmo quando já se afastara da política que daqui muitos doentes pobres puderam ser internados para receber tratamento na Santa Casa de Campinas e que, muita paturiente sem recursos, pôde receber assistência na Maternidade da mesma cidade.
É bem por tudo isso, senhor presidente, que em 19 de dezembro de 1955, ao apresentarmos nosso projeto de lei nº 47-55 dizíamos: – ‘AMERICANA tem uma grande dívida a resgatar e, com o passar do tempo é imperioso reviver o assunto para que o Poder Público tome a resolução, como lhe cabe de em nome da cidade e do seu povo, saldar essa dívida de gratidão e justiça e justiça”.
Esse projeto de lei, que ficou dormindo todo esse tempo o sono do esquecimento, visava a ereção de um busto de ANTÔNIO ALVARES LOBO em praça pública da nossa cidade. O ensejo é oportuno para pedirmos que êsse projeto de lei volte a ser apreciado pela casa, numa homenagem justa que traduza o reconhecimento da nossa terra e da nossa gente a esse vulto inconfundível de cidadão e patriota, que tanto fez pela nossa cidade.
O dr. Antônio Lobo que se casara com d. Guilhermina, senhora de perclaras virtudes e esposa dedicada, em 17 de abril de 1884, falecia cinquenta anos depois, no dia em que se comemorava, com todos de sua família, as bodas de ouro matrimoniais do casal em 1934.
São estas as palavras, Sr. Presidente, que me cumpria pronunciar neste ensejo e verifico que elas não tiveram colorido e a expressão que V.E. e os demais membros desta casa esperavam. Elas traduzem, porém, com toda minha sinceridade, a mais cálida homenagem que eu presto à memória saudosa do nosso patrono, o dr. Antônio Alvares Lobo”.