O cotidiano e os cinemas em Villa Americana
“Senhor presidente, solicito que a Câmara oficie o Sr. Prefeito Municipal sobre o fato de que grupos de rapazes à noite, e principalmente à saída dos cinemas, se aglomeram frente ao colégio das irmãs Salvatorianas, onde promovem algazarras e proferem termos impróprios…”.
A solicitação do vereador Estevam Faraone, ocorrida em 17 de junho de 1949, ilustra o cenário de uma cidade crescente urbana e industrialmente, na qual o cinema é uma das poucas opções de diversão de jovens operários para as noites da semana. Acreditem, cinema era barato. O citado colégio ainda não possuía sede própria e funcionava na residência da família Faraone, que também era a moradia das freiras. Este imponente casarão ficava na rua 30 de Julho esquina com a rua Vieira Bueno, em frente ao Cinema Central.
Americana sempre contou com diversos cinemas, sendo a “Feola, Picolli & Mantovani” a primeira firma de projeções, iniciando seus trabalhos na Sociedade Italiana, e posteriormente no Clube Ermetti Novelli, também na rua 30 de Julho. O fato de que aqui o rico comércio prosperou nas mãos de muitos estrangeiros cosmopolitas deve ter influenciado nesta paixão pela sétima arte.
Carmine Feola foi um homem moderno. Acendeu no cinema a primeira lâmpada elétrica com ajuda de um gerador, em 1918, e demonstrou arrojo ao construir o prédio do Cinema Central, que era suntuoso para a época e passou a ser considerado um ornamento urbanístico de Villa Americana. Foi também um apaixonado. Ao término de todas as sessões de exibição, levava de bicicleta os rolos do filme para ser exibido no cinema de Carioba e retornava ao término desta segunda apresentação.
Os cinemas, principalmente em seu período mudo, empregavam muitas pessoas, principalmente músicos, fato que também demonstra a presença de uma porcentagem de moradores eruditos, pois três bandas apresentavam-se simultaneamente entre as décadas de 1910 e 1920. Estas foram compostas ou regidas por artistas que tornaram-se famosos, como Germano Benencase, Silvino José de Oliveira, Silvio Bianchi e Heitor Cibin.
Em 23 dezembro de 1950, novamente causando admiração pela beleza arquitetônica, foi inaugurada a Empresa Cinematográfica Cacique. Localizada na Praça Comendador Muller, “defronte ao jardim público, ponto mais pitoresco da cidade”, esta construção, anexa a um grande hotel, aspirava representar naquele momento todo o desenvolvimento econômico e social do município, mas também da Companhia Melhoramentos de Americana.
Além da bela arquitetura, foi propagandeado de ser provido “de aparelhos de som e projeção marca Zeissikon, de máxima precisão”, encontrados apenas na cidade de São Paulo, e de possuir “entre camarotes e plateia, mil e quinhentos lugares, duplamente maior que o melhor cinema da cidade”, oferecendo a novidade do declive com “poltronas de madeira, artística e tecnicamente confeccionadas em São Paulo”, possuindo ainda ampla sala de espera e ar renovável.
Caro leitor, após ter compartilhado aqui algumas histórias, gostaria de receber relatos de suas experiências cinematográficas: quando, onde, com quem, se voltaram a pé, qual o percurso, enfim quais são as suas lembranças? Escreva para contato@12denovembro.com.br.
Texto e pesquisa: André Maia Alves da Silva, historiador e presidente do Instituto 12 de Novembro.

Cinema Central na rua 30 de Julho (foto do acervo de Hercule Giordano)

Rua 30 de Julho em 1910; à esquerda, o prédio mais alto é o casarão da família Faraone